A 2ª ediçao do Festival SUMMERCASE vai ficar de certeza na retina e nos ouvidos das largas milhares de pessoas que passaram por lá (nomeadamente em Barcelona, local de que se fala aqui).
Um cartaz com 50 nomes (com a baixa de última hora de Mika, por motivo de doença), repartido por duas noites de forma equilibrada, mantendo uma matriz que se pode resumir da seguinte forma: meia dúzia de nomes como grandes cabeças de cartaz (Arcade Fire, Bloc Party, Kaiser Chiefs, Air...), clássicos intemporais num regresso mais que aguardado (The Jesus And Mary Chain, OMD), confirmaçoes e futuras revelaçoes da cena musical actual (The Gossip, The Pigeon Detectives, Guillemots, The Hidden Cameras, Editors...) e grandes figuras da electrónica (DJ Shadow, LCD Soundsystem, 2manydjs, Chemical Brothers...).
O resultado foi uma enchente massiva de público ávido de presenciar ao vivo todos estes nomes, com muita vontade de festa e com o extra (sem estar, de todo, previsto) de assistir a alguns dos melhores concertos jamais vistos e a autênticos momentos de glória e êxtase (as sensaçoes sentidas ficam à descriçao de cada um).
Foi (de novo) uma aposta claramente vencedora, com (bastantes) resultados memoráveis. Ficam aqui alguns deles.
Sexta, 13
- The Maccabees
Cinco elementos vindos de Brighton em palco a destilarem pura energia e alguma rebeldia sonora, recebida condignamente pelo público presente a essa hora (por volta das 19h30).
Sao uma das novas sensaçoes britânicas (o que por si só nao significa muito), mas estes "putos" que estao em palco têm vontade de "comer" o mundo musical, à conta de "riffs" melódicos acompanhados de uma voz agressiva q.b. (a fazer lembrar, por vezes, Paul Smith, vocalista dos Mäximo Park). O som dos Bloc Party também faz mossa por aqui...
O futuro é já ali ao virar da esquina e espera por eles!
- The Hidden Cameras
Grupo canadiano de fina estirpe liderado por Joel Gibb, cujos elementos em palco (8 + 1 animador que fazia nao sei bem o quê), provocaram a primeira grande festa do dia no palco/terminal E (cuja vista para o Mediterrâneo como pano de fundo era fantástica).
Cançoes pop-rock com um travo de folk, por vezes algo psicadélicas, foram a receita devidamente condimentada para a cerca de 1h30 de espectáculo.
Música para ambiente bucólico, mas que nao destoa no caos urbano (onde foi muito bem recebida).
- Editors
Com pontualidade mais que britânica, às 20h10 os Editors começaram a sua actuaçao, toda ela pautada pelos tons sombrios/festivos (aparente contradiçao assumida pela própria banda de Birmingham) ainda em plena luz do dia.
Com o último álbum "An End Has A Start" ainda acabadinho de sair, os Editors souberam coordenar um alinhamento cheio de bons momentos (como exemplo, "Munich", autêntica ode ao legado Joy Division e ao movimento pós-punk), provocando a primeira enchente no palco principal e o primeiro grande concerto do festival.
-Guillemots
Praticantes de uma pop marcadamente expressionista, os Guillemots tiveram uma actuaçao que teve tanto de entrega por parte da banda, como de aceitaçao estranha por parte de algum do público presente.
O som é elaborado até ao limite, com um resultado que tem tanto de brilhante como de estranho (mas que se vai assimilando progressivamente). Músicas entrecortadas entre si deram um resultado que merece ser visto de novo.
- Lily Allen
Confirmaçao ou nao do "hype" criado à volta desta inglesa, era a expectativa de muita gente que se aglomerava à sua frente e, a julgar pela reacçao da maioria, o "hype" tem mesmo conteúdo e razao de ser.
Artista-chave no panorama "My Space" reinante nos dias que correm, Lily Allen apresentou um concerto repleto de músicas frescas (pertencentes ao seu bem sucedido primeiro disco "Alright, Still", onde funde habilmente refroes pop com refrescantes cadências jamaicanas), a condizer com o seu "look" de vestido branco esvoaçante, num ambiente relaxado e festivo de forma equilibrada e que teve o expoente máximo com o single "Smile", verdadeira música de verao e com super boa onda, seguida de uma excelente versao de "Heart Of Glass" dos Blondie.
Eficaz q.b., mas nao fantástica. Ouve-se bem, o que nao é mau atendendo a algumas críticas menos positivas a esta artista praticante de um reggae/ska, sustentada em palco com um trio de metais e um baixo a fornecerem o "groove" necessário.
- Phoenix
Pela segunda vez a actuarem em Barcelona, os franceses Phoenix apresentaram o seu som de marca, numa linha entre o pop-rock e alguma electrónica dos anos 80.
Demasiada pompa e alguma circunstância podem servir para definir a prestaçao do grupo, com um abuso claro dos "vocoders" nalgumas cançoes, a tocar o irritante.
Têm bastantes seguidores por estas paragens, o que nao quer dizer nada (ou talvez sim, para os elementos da organizaçao). Sao, também, o grupo favorito de Sofia Coppola (nao raras vezes inclui as suas músicas nos seus filmes); o facto do vocalista ser seu marido nao deve ter nada a ver com isto...
Para ouvir, ver e seguir para outro palco (onde actuava a senhora PJ Harvey).
- PJ Harvey
Cheio! Demasiado cheio o palco/terminal (neste caso era uma tenda gigante, que se revelou ser pequena demais) onde PJ Harvey deu o seu único concerto por estes lados (na realidade, os concertos do SUMMERCASE em Madrid e Barcelona foram os únicos anunciados para o corrente ano, com excepçao de outro dado em Manchester alguns dias antes deste que aqui se fala).
Polly Jean a solo! Polly Jean é "grande" e a sua voz (acompanhada por uma guitarra e piano tocados alternadamente por ela) chegam para preencher o palco.
Polly Jean é bela! Polly Jean tem uma presença em palco única, com um charme inigualável.
Polly Jean é um dos animais de palco mais intimidantes, viscerais e perturbantes que o rock viu nascer na última década.
Música em estado puro: voz e guitarra (e as palmas do público).
"4-Track Demos" e "Dry" sao os discos em estado de evidência, em termos de crudeza de som ao longo do concerto. "Rid Of Me" é um daqueles clássicos que vem com a palavra "intemporal". Genial!
O próximo disco, "White Chalk", com data de saída prevista para Setembro próximo, vislumbra uma sonoridade algo mais polida, com o piano e a harpa a serem instrumentos de eleiçao nas novas cançoes.
Em contra: nível de som paupérrimo.
- The Flaming Lips
"Grandes"! Este grupo de Oklahoma é uma das maravilhas do mundo musical. Movem-se num universo muito pessoal criado por esse génio, de nome Wayne Coyne.
Antes foram punks. Hoje sao a quintessência do rock mais emotivo, aquele que atinge directamente o mais profundo de cada um e que faz parar de sentir tudo à nossa volta.
"Finally The Punks Are Taking Acid" e "The Soft Bulletin" sao (apesar de estética e musicalmente diferentes) obras maiores da história recente da música. Os The Flaming Lips, cientes disso mesmo, deram mais um concerto de antologia, onde o seu desempenho (tao festivo como lírico), foi acompanhado pelos já tradicionais baloes gigantes, marcianos, Pai Natal, imagens de Teletubbies e explosoes nucleares e sangue, uma bola gigante (que serviu para Wayne Coyne andar sobre o público) e confetis (muitos confetis) a darem o tom onírico à sua actuaçao.
Confesso: a primeira e a segunda vez que os vi foram experiências únicas (e sem a ajuda de nenhum aditivo mais psicadélico)! A terceira nao foi excepçao.
- The Whitest Boy Alive
Uma das metades dos noruegueses Kings Of Convenience (Erlend Oye) em pose electro-acústica, a debitar algumas das melhores cançoes pop feitas em nome próprio.
Para ver e ouvir noutro local e ambiente mais acolhedores.
- Arcade Fire
Por mais palavras que existam, sao poucas para descrever o que é assistir a um concerto deste "combo" de art-rock, apresentando as suas "tragédias sónicas". A partir daqui estao avisados.
Para muitos, o principal nome de todo o festival. Nao sao velhas glórias nem novas promessas; estes canadianos sao, actualmente e quase sem margem para discussao, a banda contemporânea de rock em melhor estado de forma e que, a cada álbum que lança, escreve uma nova página da história da música. Existem, actualmente, poucos grupos que sejam tao consensuais em relaçao à sua qualidade (quer em disco, quer ao vivo) como os The Arcade Fire (grupo guiado por Win Butler e a esposa Régine Cassagne).
O mais recente "Neon Bible" veio provar à saciedade que "Funeral" nao foi um momento único de criaçao genial por parte deste septeto (que em palco sobe para 10 elementos, num alegre elogio da anarquia e desordem sonora) de Montreal que devolveu uma certa alma perdida à música, condensando décadas de alguma da melhor música popular (do punk ao pós-punk, do blues à folk, passando pelo glam-rock de David Bowie, em cançoes imensas que aliam melodias inflamadas, especialidade de Butler, com arranjos orquestrais que servem a Cassagne para dar rédea solta à sua formaçao clássica). As suas cançoes sao imensas, nao só pela sua excelência, mas também pelo seu "corpo": abrasivas, exuberantes, mais grandes que a vida, assaltando por completo os sentidos de cada um. Os The Arcade Fire sao um caso raro de grandiosidade eloquente no rock. Sao "enormes", em qualquer sentido artístico. Tao simples (ou complexo) como isto!
O impulso dominante no palco é o de uns músicos que intercambiam constantemente e sem nenhum tipo de problema de instrumentos (às vezes dentro da mesma cançao). Vozes, coros, ruídos de megafone, guitarras, pianos, violinos ou xilofones convivem entre si com amor para conseguir algo, no final, parecido a uma catarse colectiva.
Seguramente um dos melhores concertos de todo o SUMMERCASE 07, a actuaçao dos Arcade Fire foi um autêntico monumento no que toca à emoçao colectiva que conseguiram transmitir. As suas músicas (hinos para todo o sempre, acreditem) sao por si só geniais, onde os elementos orquestrais ganham uma dimensao quase indescritível. O conceito de orquestra rock (dado o número de elementos em palco e o tipo de instrumentos tocados) nunca teve uma designaçao tao perfeita.
O título do novo álbum é, porventura, uma fina ironia, na medida em que é de um acontecimento quase bíblico em tons de néon que se trata, quando falamos de um concerto destes senhores. O tom épico e magistral das suas orquestraçoes dao o mote a quase todo o concerto, com um nível tao alto onde é difícil destacar momentos, com direito a um "encore" de duas músicas (completamente insuperável o final com "Wake Up").
Quando se (re)escrever a história da música, a letra "A" vai ter à cabeça os The Arcade Fire. Nao se esqueçam de que estamos a presenciar o nascimento e evoluçao da melhor banda surgida neste século XXI (até à data)!
Toda uma experiência mágica, bela, verdadeiramente indescritível! A repetir vezes sem conta!
- The Pigeon Detectives
O rock está-lhes nas veias em doses mais que apreciáveis; sao mais um dos projectos vindos da fornada rock inglesa que desembarcam na Europa Continental para demonstrar o quao vibrantes sao ao vivo.
Como todos os "hypes" criados (sobretudo por semanários ingleses), há uns que têm mais substância que outros; estes, claramente, têm tudo a seu favor: atitude contagiante, cançoes construídas à medida da voz do seu vocalista (incansável durante toda a performance) e uma vontade de transmitir uma boa onda ao público que têm diante de si.
Depois da ediçao de vários EP's, o jovem quinteto proveniente de Leeds publicou "Wait For Me", álbum que aspira a ocupar o trono da "next big thing" do pop-rock inglês. Promessa brilhante! Kaiser Chiefs e Mäximo Park com concorrência à vista.
- Bloc Party
Com um mar de gente à sua frente, os Bloc Party deram aquele concerto que qualquer fa quer ver e ouvir: os singles mais ouvidos (todos eles potenciais "hits") e uma prestaçao da banda imparável (o que já vem sendo hábito por parte de Kele Okereke e companhia).
No entanto, os Bloc Party (criadores de alguns dos melhores singles nos últimos anos - "Banquet", pertencente ao primeiro "Silent Alarm" é o exemplo mais que perfeito, diga-se o que se disser -), poderao estar a entrar um bocado já naquela fase de "OK. Com músicas deste calibre só precisamos mesmo é de as tocar como estao no disco e já está." Mas essa atitude, que eu chamaria de limbo artístico, pode ser perigosa, na medida em que pode tornar-se maçadora e algo repetitiva para o público.
É nestas alturas que as remisturas (feitas por outros artistas) ou novas versoes (feitas pela própria banda) podem fazer "milagres" pela saúde artística de um projecto.
- LCD Soundsystem
O rock e a electrónica casaram e tiveram um filho: chama-se LCD Soundsystem. E foram felizes para sempre!
James Murphy, pode dizer-se, que é para a música o que Quentin Tarantino é para o cinema: criou um estilo único à custa da "exploraçao" até ao tutano dos seus ídolos, tendo criado duas obras ("LCD Soundsystem" e "Sound Of Silver") que se tornaram em paradigmas da música de dança contemporânea. A artistas deste tipo e com esta visao costumam chamar-lhes génios!
James Murphy e restantes elementos deram, simplesmente, um dos melhores concertos deste festival. Cada música, cada tiro certeiro directamente à zona do cérebro que faz mover o corpo em movimentos espasmódicos de dança incontrolada. Bem hajam!
Início demolidor com "Daft Punk Is Playing At My House"; "North American Scum" seguiu-a em velocidade de cruzeiro e ia provocando um motim controlado. "Tribulations", mais "ácida" que nunca!
Até a tenda gigante "transpirava" quando os primeiros acordes de "Yeah" começaram. Demasiado forte para aguentar e seguir o ritmo. Eletri(o)zante!
Final de concerto com a ode "New York I Love You, But You're Bringing Me Down" em jeito de tributo à cidade que os viu nascer. Só faltou a melhor cançao do ano (até agora), "Someone Great", para ser perfeito!
James Murphy é o "rei-midas" do novo milénio. E ainda só lançou dois discos com os seus Lcd Soundsystem. Tudo o que tenha o seu "toque" mágico ou a chancela DFA é razao de qualidade assegurada.
Punk-funk de boa colheita, com muito ainda para dar!
- Scissor Sisters
A típica banda que ganha em palco aquilo que nao consegue transmitir em disco (apesar de um bom punhado de cançoes divididas pelos dois álbuns editados até à data).
Ana Matronic é uma autêntica líder no palco, juntamente com Jake Shears, transmitindo um clima de festa permanente e muito colorido.
Devido à falta de comparência de Mika, foram os únicos representantes a cantarem em falsete, para deleite dos muitos fas que assistiam em regime de autêntica diversao.
"Take Your Mama Out" é o exemplo acabado de como uma música pode ser muito melhor quando executada em palco. "Confortably Numb"(uma das reconstruçoes mais delirantes da história pop) foi sem dúvida o melhor momento do concerto, com uma roupagem ainda mais electrónica e dançável.
Máxima expressao de grupo festivo "heterofriendly"!
- Amable & Gato
Nao sao uma dupla na real acepçao da palavra (como por exemplo os irmaos Dewaele sao), já que cada um actua a solo, mas aqui os residentes do Razzmatazz (uma das melhores discotecas em Barcelona) fizeram uma sessao a "quatro maos". O resultado foi o do costume, quando enchem as pistas do Razz aos fins de semana, com a mistura cuidada e sempre muito hedonista da melhor electrónica com o rock mais vibrante e dançante. Pelas suas maos passaram músicas de The Gossip, Modest Mouse, LCD Soundsystem, entre outras pérolas do "indie" mais interessante, que "provocaram" os corpos mais pesados (àquela hora da madrugada) a movimentarem-se vigorosamente.
Altamente recomendável (para quem nao vai ao ginásio regularmente, como li um destes dias numa tira de BD)!
- 2manydjs
Esta dupla belga é (quase) sempre igual, ou seja, genial na forma magistral como mistura o impensável (um bom momento, a título de exemplo, o "mash-up" com CSS + Lipps Inc + Tiga).
Os irmaos Dewaele (mentores dos nao menos interessantes Soulwax), sao um caso de sucesso garantido em qualquer sítio que tenha a sua presença.
Já nao sao originais, mas conseguem criar sempre um grande ambiente de festa, e foi isso mesmo que conseguiram no final da primeira dose de SUMMERCASE 07.
Saturday, July 21, 2007
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